Artigo publicado no jornal Correio Braziliense em 20.07.2014 (Acesse aqui)

O Banco dos Brics – Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) -, criado nesta semana, é mais do que uma necessária iniciativa financeira, concretizando discussões, pesquisas, estudos que, no Brasil, vem de muito tempo preocupando Guido Mantega no Ministério da Fazenda, o Itamaraty e muitos centros de pesquisas econômicas, como a Fundação Getulio Vargas, por exemplo.

Sua criação concretiza um clima favorável a inovações em multilateralismos que se abre não com o declínio norte-americano, que nem de longe está perto. Mas, com a guerra do Iraque, com a crise de Wall Street em 2008 e com equívocos geopolíticos da Era Bush e da Era Obama também.

Os Estados Unidos são uma democracia que, além dos problemas externos, enfrentam cada vez mais crescentes problemas de governança interna, dada a disputa de poder entre republicanos e democratas, com eventuais paralisias decisórias no Congresso.

Talvez, o principal artífice do Banco dos Brics por aqui tenha sido o Itamaraty, com seu novo estilo, comandado, desde o segundo semestre de 2013, pelo Ministro Luiz Alberto Figueiredo, que deixa transparecer que, além de uma geopolítica para guiar as relações exteriores, existe também uma geoeconomia. O que é isto?

Trata-se da estratégia econômica que, ao lado de conceitos macroeconômicos globais, se importa também com os efeitos geográficos destas estratégias. Preocupa-se com a formação de blocos, de alianças, de convergências de países, através de coordenadas ações econômicas, conforme simboliza o recém criado Banco. Afinal, cada país, parodiando Ortega y Gasset, é uma nação e seus interesses e circunstâncias econômicos.

O fato de, após muita discussão, a sede do banco ser em Xangai, por exemplo, traz uma preciosa vitória para o Brasil. Lá teremos, com certeza, algumas centenas de especialistas brasileiros trabalhando no banco e aprendendo como lidar com as sutilezas do mercado asiático. China, Rússia e Índia, sobretudo.

Será, sem dúvidas, uma escola local que poderá nos ensinar a lidar com processos, valores, negociações muito diferentes daquelas que ocorrem em Washington e Nova York.

A estratégia de fazer a reunião logo em seguida à Copa do Mundo permitiu, também, encontros, ainda que informais, entre Vladmir Putin e Angela Merkel. A Alemanha é um membro do G7 claramente insatisfeito com as sucessivas interferências dos norte-americanos em espionagens internas. Putin não pode ser isolado

A Alemanha não tem as mesmas razões que os Estados Unidos para a distância ou aproximação com Moscou. Ao contrário. As relações russo-germânicas têm que se estabelecer em outros patamares. Não havendo mais bases militares americanas na Alemanha, exceto aeronáutica, e não havendo mais uma Alemanha controlada pela União Soviética, como em épocas de Guerra Fria, novas possibilidades se abrem para diversificação. Pelo menos enquanto houver grande interdependência do gás russo.

Os chineses vão usar o Novo Banco de Desenvolvimento para financiar projetos agrícolas na África, expandindo também, através da geoeconomia, sua geopolítica. E ao Brasil abre-se ainda a chance de ajudar a vizinha Argentina, um de seus maiores parceiros econômicos, em crise atualmente.

Até hoje, havia um oligopólio no mercado das instituições financeiras globais – Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional e Banco Interamericano de Desenvolvimento – sobretudo. A partir de agora, com o novo banco, este oligopólio começará a enfrentar um embrião de concorrência. Ainda é muito cedo para dizer qual será o vigor desta concorrência.

Mas, o fato inconteste é que o Banco dos Brics, que se cria depois de um coincidente almoço com a alemã Angela Merkel, cria alternativas, não somente para o Brasil, para Rússia, China, África do Sul e Índia, mas para o mundo em geral.

A geoeconomia está colaborando para uma nova e mais realista geopolítica de invenções, inovações institucionais e possibilidades multilaterais. Sobretudo para quem, como nós, não é uma potência nuclear.