À medida em que o Ministério Público tem mais e mais importância no destino do Estado Democrático de Direito e na confiança dos cidadãos, tem também mais apoio ou mais crítica. É natural.

A sociedade presta mais atenção e avalia mais e mais seus procuradores e suas instituições, como a Procuradoria-Geral da República e o Conselho Nacional do Ministério Público.

O critério maior dessa avaliação tem sido simples: até que ponto essas instituições resistem a pressões? São independentes no seu fazer? Resistem a qualquer tipo de pressão: seja de políticos, seja de ministros do Supremo, seja inclusive do corporativismo da própria classe, seja de investigados ou denunciados. Sobretudo dos que querem pará-los.

Nestes dias esta resistência vai ser exposta no CNMP.

Primeiro, no lamentável caso do auxílio-moradia, pois, ao que tudo indica, há uma mudança de posição. Não vão ser acordos com a AGU ou decisões do CNMP os responsáveis por amortecer danos ao orçamento ou à sua credibilidade.

Segundo, o CNMP terá que definir o que é decoro, ao qual os procuradores são, por lei, obrigados a respeitar no exercício de sua profissão. Isso é o que está em jogo na eventual denúncia contra o procurador Carlos Fernando. Acusam-no de falta de decoro por fazer críticas contundentes a Michel Temer.

Até que ponto um procurador pode se manifestar sobre processos em curso? Até que ponto o dever de decoro se choca com a liberdade de expressão e com o dever de informar a sociedade? Ao contrário da constituição de 1967, o lado do MP agora é a sociedade e não o governo. O passado ameaça voltar como assombração.

São dois os caminhos para o CNMP enfrentar esse desafio. Por um lado, usar a Corregedoria para analisar caso a caso. Muito arriscado. O Corregedor de hoje não é o de amanhã. Deixar para julgamentos individuais a definição do que é decoro é deixar uma porta aberta para pressões permanentes e eventuais abusos de autoridades. Politiza o Conselho permanentemente.

O outro é tentar estabelecer critérios, padrões, regras de caráter mais geral, depois de amplamente discutidas internamente, com a sociedade e com todos os interessados. Observando a experiência internacional, inclusive.

Aquele é o caminho da regulamentação como individualismos. Vejam o que ocorre com o Supremo à medida em que julga ações individualizadas. Vira um Supremo Criminal, em vez de ser um Supremo Constitucional.

Hoje é uma arena de pressões e alianças políticas, algumas mais evidentes, outras menos. É o caminho da conjuntura e da fragmentação. Da incerteza. Para todos. Inclusive para os próprios procuradores.

Este o da regulamentação, é um caminho mais permanente, mais institucionalizante e, sobretudo, capaz de orientar a própria classe dos procuradores. E a sociedade. Um caminho mais de previsibilidades do que de sustos.

O Conselho Nacional do Ministério Público, assim como o Conselho Nacional de Justiça, tem quase quinze anos de existência. Está entrando em uma fase onde a sociedade irremediavelmente pergunta: Valeu a pena?

 

*Artigo publicado no Jota, em 14.05.18. Acesse aqui.