Artigo publicado na revista Tribuna do Advogado, em setembro de 2016.

Nada tem mais força do que uma ideia cujo tempo chegou. Mensalão e Lava-jato demonstraram que chegaram hora e vez de eliminar ou reduzir o foro privilegiado.

O atual modelo não funciona. Até o Mensalão não havia político responsabilizado em definitivo pelo Supremo Tribunal Federal por eventuais atos incorretos. Hoje, leva-se tempo. Segundo dados do Supremo em números, da FGV Direito Rio, são necessários mais de 1.200 dias para julgar ações penais contra quem detém foro privilegiado. A tentativa do STF de agilizar, transferindo para turmas, não funcionou. Os 1.396 dias de 2014 aumentaram para 1.536 em 2015.

A justificativa de que o julgamento por órgão colegiado de instância máxima protegeria magistrados de instâncias inferiores de pressões políticas locais não é regra geral. Não se demonstra na realidade.

A independência de um juiz não se mede pela instância em que atua.

Sérgio Moro, juiz na 13ª Vara Federal de Curitiba, prova: 74 prisões preventivas, 91 temporárias, seis em flagrante. São 61 acordos de colaboração premiada, cinco acordos de leniência, 21 sentenças.

Os números sugerem que detentores de foro privilegiado que cometeram ilícitos sentem-se mais protegidos quando julgados pelo Supremo do que por juiz local. De 1988 até 2015, apenas 16 dos mais de 500 parlamentares investigados e processados no STF foram condenados por crimes contra a administração pública.

Não se trata de escolha entre quem pune mais. Mas de se levar a sério a indignação dos eleitores com a corrupção política. Através de julgamentos independentes, que protejam tanto o direito de defesa quanto a razoável duração do processo.

O atual modelo não tem produzido responsabilização suficiente. Mas irresponsabilização excessiva. O que se reflete nas pesquisas de confiança nas instituições. Congresso e Legislativo, os menos confiáveis. Insuficiente confiança no Judiciário.

O desafio é pois: como restaurar a confiança necessária na democracia?

Não nos falta imaginação institucional. Luís Roberto Barroso, por exemplo, tem proposta que atende aos receios das inúmeras e indevidas pressões políticas. Criação de vara federal especializada no Distrito Federal para julgar os que hoje possuem competência privilegiada. Magistrado com mandato. Indicado pelo Supremo. Existem outras.

A questão agora é de estratégia legislativa. Inúmeras PECs já refletem o desejo dos eleitores de extinção do foro privilegiado. Difícil de serem votadas por um Congresso onde aproximadamente um terço de seus membros são investigados ou respondem a processos por mais de 60 tipos de crimes diferentes.

Uma norma de transição, preservando o foro para os detentores de mandato hoje, seria indispensável.

A mobilização dos eleitores também. No espaço e-Cidadania do site do Senado, consta consulta pública sobre a PEC 10/2013. O cidadão pode votar, endossando ou não a proposta de extinguir o foro privilegiado.

Mudar é sintonizar o Judiciário com os detentores do poder político originário: o povo. Esta sintonia depende da percepção de que o Judiciário é eficiente. Quanto mais o for, mais o cidadão vai procurar a Justiça. E os advogados.

Mudar é também uma tentativa de o Judiciário ser mais eficiente. Mais os cidadãos procurarão a Justiça. E correlatamente mais advogados serão necessários. Justiça eficiente é também maior mercado de trabalho.