Fórum Estadão – A Reconstrução do Brasil

27/02/2018

O ‘Estado’ promoveu nesta terça-feira o primeiro evento da série de eventos com gestores, líderes políticos e representantes da sociedade civil em torno de uma agenda do País.

O fórum de hoje, chamado ‘Hora de Mudar’, recebe o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso para falar dos desafios do próximo governo. O painel de discussão com propostas para modernizar a Constituição será feito com os juristas Nelson Jobim e Eros Grau, além do professor de Direito Joaquim Falcão, da FGV-RJ.

Começa o primeiro painel sobre a modernização da Constituição de 1988 com o professor Joaquim Falcão, da FGV-RJ.

O ex-ministro Eros Grau também é chamado para ocupar seu assento.

Assim como o ex-ministro da Defesa e presidente do STF, Nelson Jobim.

Fucs destaca que haverá momento para responder às perguntas da plateia ao final do evento.

Fucs pergunta aos três: neste ano em que a Carta deverá completar 30 anos, qual avaliação que vocês fazem, no que ela funcionou e não funcionou e o que é preciso para modernizá-la?

Joaquim Falcão começa a responder.

JF: Eu vim do Nordeste, vim de uma morte vida Severina, como diria Cabral de Melo Neto. Jobim e Eros são de Santa Maria, da mesma rua.

JF: a porta da Constituição é estreita. Todos queriam constitucionalizar seus direitos.

Joaquim Falcão: o máximo dessa ansiedade… tem um artigo que determina que o colégio Pedro II deve permanecer no Rio de Janeiro. Esse é um exemplo da luta para entrar na constituição. Houve demanda demais.

JF: O aumento da demanda é uma pressão para realização dos direitos. Só que não existe direito grátis. Então você tem uma crise, não somente do Estado, um momento ruim, de como atender à oferta por direitos realizados, e não por direitos demandados. E isso afeta todos os grupos sociais.

Quem fala agora é o professor de Direito da FGV-RJ, Joaquim Falcão.

JF: os Poderes deveriam equilibrar… O Poder Moderador não é o Supremo, é a aplicação da Constituição por todo mundo.

JF: A Constituição é a sua aplicação, sua administração. A Constituição de 88 foi extremamente positiva para o País, nos assegurou liberdade, somos um dos países onde o nível de liberdade é o mais consolidado de todos. Temos problema grava de desigualdade ao acesso aos direitos demandados. E temos, o que para mim é uma complicação, uma ineficiência dos Três Poderes que são responsáveis pela gestão da Constituição.

Joaquim Falcão agradece e começa Eros Grau a falar.

Eros: não sei por onde começar, há tantas coisas…

Eros compara número de artigos entre Constituição do Brasil e dos EUA, e cita Olavo Bilac: “crianças, não verás um país como este”.

Eros: acho fundamental compreender como a Constituição americana continua em vida e aprender uma distinção entre o que está escrito e o que os juízes aplicam. Eles transformam o texto em norma. Isso é fundamental compreender. Mas isso não é apenas ume exercício intelectual, ela é determinada pelas circunstâncias.

Eros diz que não gosta de ser apresentado como ministro do STF, gosta de ser apresentado como professor da Faculdade de Direito da USP, do Largo de São Francisco.

Eros: o CP fala em atentado ao pudor público, em 1940. Imaginem uma mulher que vá à praia de topless em 2018. Essa mulher não será importunada. Embora o texto seja o mesmo, a norma é outra. É isso que é fundamental. Os juízes, eles conseguem e devem conseguir sempre… Eles produzem normas compatíveis com a realidade.

Eros: o velho general De Gaulle disse que a Constituição é um envelope.

Eros: o que está contido dentro do envelope surge no e do dinamismo da vida político-social.

Eros: a Constituição é móvel, está sendo sempre alterada. Não existe a de 1988, existe é a Constituição do Brasil tal e qual está sendo aplicada hoje.

Nelson Jobim começa a falar.

NJ: 1987, FHC foi relator e eu era seu amanuense. Nós tivemos questão política séria e tivemos que inventar forma de fazer uma constituição.

NJ: era mais fácil votar um texto do que uma lei na Assembleia Constituinte.

NJ: uma grande disputa, o MP queria se igualizar com a questão salarial. Nós tivemos uma enorme demanda de constitucionalização para proteção de interesses e guardar seus espaços.

Falcão faz intervenção para falar do acesso ao Supremo: o trabalhador tem 16 menos chances de chegar ao Supremo do que um servidor público.

NJ: nós tivemos que recorrer à ambiguidade. Posteriormente surge o chamado neoconstitucionalismo, que as normas infraconstitucionais têm de ser princípio da lei.

NJ: Aí começou a chegar princípio de todos os jeitos. Nós precisamos fazer uma lipoaspiração na Constituição.

NJ: também se tentou uma cláusula de barreira, deu 37 partidos. No momento de alta constitucionalização fortíssima, você alimenta o presidencialismo de coalizão.

Fucs pergunta a Jobim obre a lipoaspiração. Como ela seria viabilizada?

NJ: Esse plano apresentei para FHC em 85, mas não era viável. As áreas da Carta que teriam de ser infraconstitucionais, coloca para essas disposições transitórias e estabelece que leis futuras vão mudar aquelas regras. Ou seja, fazer em dois momentos.

Fucs fala da frase de Falcão: “O Supremo é o CEO do Brasil”.

JF: a função do STF é por um ponto nas incertezas. O que vemos é um Supremo que gere a incerteza de um modo patológico. Porque a lei manda devolver o pedido de vista em 15 dias. Tem pedido de 500 dias. Nós estamos com caso do Toffoli e do Fux do auxílio. É a consequência econômica da vista. Enquanto eu segurar a vista, a lei é lega, então o pagamento não vai ser devolvido. A incerteza tem uma incerteza inerente ao Supremo. Quando vai entrar a Ficha Limpa? É inerente. Agora não é inerente você não respeitar os mecanismos regimentais desses processos. Vocês sabem qual é a citação, remissão, dos votos mais citados pelo Supremo? É um do Celso Mello de uma liminar que não foi confirmada até hoje.

Eros: o Supremo se transformou num tribunal monocrático de 4 ou quinta instância.

Eros: o Supremo que é um órgão colegiado…

Eros: é preciso aplicar a lei.

Eros: 2005, um amigo fraterno era presidente do STF, em 2005. Veio um juiz da corte francesa para uma mesa-redonda. O francês perguntou o número de processos e ficou espantando e disse que na França, naquele ano, eles iriam julgar 85 processos. Depois fui pra França e ele disse: você notou que quando passo na rua ninguém me cumprimenta? Aqui ninguém me conhece e não sou ator de televisão.

Eros: O Supremo se transformou num grande espetáculo televisivo.

Jobim: o problema está na origem da indicação, que é uma relação direta com o presidente que o indicou. Aqueles que passaram a ter relação direta ou indireta com o presidente em decorrência de uma biografia prévia não precisam do tribunal para fazer sua biografia.

Eros: fui relator do processo da anistia. Pensei comigo: se me aposentar vou olhar para mim e dizer “fugiu”. Quando o processo caiu na minha mão, fui capaz de compreender que minha vida pessoal não tinha nada a ver com o meu papel de juiz.

Eros: não faz o menor sentido hoje levantar essa história hoje.

Fucs pergunta para Jobim sobre prisão em segunda instância.

Jobim: na discussão tem uma alternativa do Toffoli que a prisão se desse só depois de decisão do STJ, considerando as radicalizações. Eu sou favorável dessa decisão.

Jobim: o que complica é que você tem já uma decisão tomada por maioria do STF estabelecendo a prisão em segundo grau, e tem decisões monocráticas que não obedecem às próprias decisões do Supremo. Hoje o que está acontecendo é uma soma de vontades individuais no Supremo.

Jobim: sou contra convocação de Assembleia Constituinte. Isso nada mais é do que a vontade de criar poder novamente. Não existe essa hipótese desse endeusamento. Não tem nada a ver com a política real.

Jobim: tudo que me diz respeito é matéria constitucional, tudo que diz respeito a você é matéria infraconstitucional.

Joaquim Falcão volta a falar sobre politização do Judiciário.

JF: quem está competindo de verdade antes da urna? É o TSE, contra o STJ, com o Supremo, o TRF-4. Dentro desses partidos judiciais, ou tribunais, é essa a disputa que está havendo. Até o 15 de setembro não teremos a verba definida para eleição. Politização ok, mas estamos num momento decisivo, da politização judicial eleitoral, onde os partidos contam menos que os tribunais. Isso que é a incerteza absoluta, incerteza das regras.

Jobim: eu não acredito que a solução de impressão do voto vai resolver algum problema.

Jobim: quando você termina a votação, você imprime e entrega para os fiscais de partido. Você tem como fiscalizar aquela sessão. Essa tentativa de impressão de voto é um retorno.

Jobim: É um retrocesso. A teoria conspiratória é sempre daquele que perdeu a eleição.

Jobim: abuso de poder econômico só existe para quem ganha eleição.

Jobim: Nelson Rodrigues dizia que os idiotas entravam na sala e ficavam quietos no canto da sala. Eu diria o seguinte, hoje os idiotas perderam a modéstia.

Joaquim Falcão: a sociedade precisa de alguma certeza do processo. O Supremo tem que colocar ordem no Supremo.

Eros Grau (Advogado, ex ministro do STF), Nelson Jobim (Sócio do banco BTG Pactual, ex-presidente do STF e ex-ministro da Justiça) e Joaquim Falcão (Professor de Direito Constitucional da FGV Direito do Rio de Janeiro).  Foto: Felipe Rau/Estadão