Artigo publicado no Jornal O Globo, em 18.10.2016

Nestas eleições, a competição não é apenas entre candidatos e partidos. É entre igrejas e religiões também. Padre e pastor. Queiram ou não, a vinculação entre religiosidade e voto é palpável. No bairro ou na rua onde existe prédio da Igreja Universal, pesquisas mostram que os eleitores votarão em Marcelo Crivella 30 vezes mais do que os católicos votarão.

Ou seja, as igrejas evangélicas influenciam decisivamente os votos de suas comunidades mais próximas. Vizinhas. O mesmo ocorrerá com as comunidades em volta das igrejas católicas? Não temos dados iguais. Mas, provavelmente, não. Além do vínculo eleitoral que não pretende, que outros vínculos têm ligado a Igreja Católica às suas comunidades?

O vínculo do amor ao próximo? O da espiritualidade? O da solidariedade e evangelização? O do pertencimento? Existem bons exemplos de paróquias com atendimento médico, jurídico e social, além de espiritual, aos seus fiéis. Mas não é a regra. Estes vínculos, como o da solidariedade — essência do catolicismo — estão hoje se esgarçando ou se consolidando?

Em nossa História, três momentos decisivos separaram a Igreja Católica da política. Primeiro, com a consolidação, na Constituição de 1891, do estado laico. O Brasil deixara de ser católico. Nação sem religião. Passou a ser de todas as religiões. Segundo, quando de nosso primeiro presidente não católico: Ernesto Geisel, luterano.

Simbolicamente, em seu governo, o Congresso aprovou a lei do divórcio. Um dogma para os católicos. Que Geisel quebrou. O terceiro momento ocorreu quando o regime militar foi contra a candidatura de dom Helder Câmara a Prêmio Nobel da Paz. O Papa João Paulo II, em nome da despolitização da Igreja Católica, não fez dom Helder cardeal.

Acabou com a Teologia da Libertação na América Latina. Cobriu a realidade da pobreza com o medo do comunismo. Mas Joao Paulo II fazia política com os sindicatos na Polônia e no leste europeu. Ali foi militante. Aqui foi implacável. Aposentou dom Helder da Arquidiocese de Olinda e Recife. Lá colocou ingênuo bispo anônimo.

Longe dos mais necessitados, a Igreja Católica colhe agora, apesar dos esforços do Papa Francisco, os frutos que plantou nesta vida terrena. Esgarçou seus vínculos de pertencimento e solidariedade com suas comunidades. Deixou vazio o severo espaço urbano da solidão, violência e desigualdade. Que o vínculo eleitoral do voto evangélico tenta ocupar.