Artigo publicado no Jornal O Globo, em 01.09.2016 (Acesse aqui)

O país esperava que a decisão a favor ou contra a permanência de Dilma Rousseff trouxesse de volta estabilidade política, econômica e segurança jurídica. Não foi o que aconteceu.

O Senado tomou decisão atípica, que pode acarretar a quebra de harmonia entre poderes, e dos poderes com a sociedade. Como?

Tudo começou com a solitária decisão do ministro Lewandowski. Dividiu o julgamento em dois: perda de mandato e perda dos direitos políticos. Poderia ter tomado esta decisão sozinho? Ou teria que ser do plenário? Esta é claramente uma decisão polêmica. E de gravidade institucional. O importante, porém, é que, ao tomar a decisão sozinho, Lewandowski optou por plantar a dúvida. Que não existiria se fosse o plenário a decidir.

E a oposição a Dilma, na euforia da vitória, não percebeu, ou não conseguiu impedir, a implantação da futura incerteza.

A partir da manutenção dos direitos políticos, ela pode voltar a se candidatar a presidente em 2018. A decisão do Senado parece a convocação antecipada de um plebiscito para 2018. Dilma sim, ou Dilma não. Se o PT deixar.

A decisão abre precedente que beneficiaria Eduardo Cunha? Foi, aliás, com pretensão de voltar a se candidatar que Collor renunciou minutos antes de ser impedido. E Renan Calheiros, como presidente do Senado. O que agora esta proibido pela Lei da Ficha Limpa. Poderá a Câmara, porém, inovar: cassar e manter os diretos políticos?

É estratégia óbvia. Se o impeachment ou a cassação são inevitáveis, salvem-se os direitos políticos. Certo mesmo hoje é que volta-se ao Supremo. A classe política parece viciada em Supremo. Cria situações em que transfere seu poder decisório para os ministros da Corte.

Ninguém pode dizer qual será a decisão do Supremo. Ela é, por natureza, incerta. É justamente na gestão da incerteza política, ou A ou B, que reside seu poder.

O Supremo assim se aumenta. Ele é hoje o gestor das incertezas nacionais. Até quando? Isto tem limites? O bom senso sugere que as instituições tomem decisões que colaborem para a manutenção de seu próprio poder.

Dificilmente o Supremo tomará decisão que anule o impedimento de Dilma. Que faça da eventual cassação ou condenação de Cunha apenas um intervalo. Colocaria em dúvida sua própria legitimidade. É ônus pesado demais.

Mas ninguém garante o bom senso.