Artigo publicado no jornal Folha de São Paulo, em 04.03.2016 (Acesse aqui)

À primeira vista, o Supremo Tribunal Federal começou a decidir o destino pessoal de Eduardo Cunha e da ex-deputada Solange Almeida. Mas foi além de aceitar a denúncia, transformá-los em réus e prosseguir o processo.

O STF se disse competente para processar e julgar um presidente em exercício de outro poder. Ainda não disse se, além de julgar, pode afastar o presidente –leia-se, do Legislativo ou do Executivo– durante o processo.

Consolidou também a importância da delação premiada. Delação sozinha pode não ser suficiente para fundamentar condenação. Mas se defender dizendo só que é mentirosa, que o delator não deve ser levado a sério, é insuficiente para evitar o recebimento das denúncias.

Quanto à delação, houve mais um passo. Os ministros rejeitaram a tese de que acordos homologados em Curitiba precisariam ser reconfirmados no Supremo.

Finalmente, outra decisão fica clara quando analisamos como os ministros trataram da denúncia contra Solange Almeida. Uns preferiram discutir a crença dela de que, ao requerer informações sobre a compra das sondas, ela acreditava que estaria exercendo a prerrogativa pessoal do parlamentar de fiscalizar.

A maioria, no entanto, optou por outro caminho.

Os atos de Cunha e Solange não cabem dentro de si próprios. Eles se extrapolam. Seu significado para o estado democrático de direito está fora deles. Os ministros estão cientes de que Lava Jato é corrupção sistêmica. Investigar é jogo de armar de relações ilícitas. Investigar é preciso.

Segundo o ministro Celso de Mello, o contexto é de corrupção de âmbito nacional, por organização criminosa, as mesmas palavras usadas quando decidiu o mensalão e que permeia Executivo, Legislativo e Judiciário talvez.

Ou seja, o julgamento individual, de quem quer que seja, vai ser analisado e decidido a partir de dois critérios. A eventual culpa ou não individual de cada réu. Assegurado o direito de ampla defesa. E também sua inserção ou não no sistema maior de corrupção, que mensalão e Curitiba revelam. Julgarão a parte no todo.