Artigo publicado no blog do Noblat, em 11.08.2015

Depende. Do policial que prende, ou do delegado que registra, ou do juiz que julga. Cada cabeça, uma sentença. Ou um destino. Pois, se consideram que é traficante, a prisão pode acabar sendo imediata. E sem prazo determinado até o julgamento. Usuário não, responde em liberdade.

Este poder de determinar o destino imediato e temporário em regra produz marcas definitivas. E tem se mostrado excessivo.

É mais ou menos como se um contribuinte pudesse ser multado ou preso por não ter pagado o imposto devido. Sem saber antes qual imposto deveria pagar. Você não sabia, mas a autoridade que lhe prende sabe. E só lhe diz quanto depois de ter autuado.

É como se você entrasse numa rua sem saber se é mão ou contramão. E só o guarda sabe. E só lhe diz depois de lhe ter multado.

É como se você precisasse de uma licença de construção sem saber se pode construir dez ou doze andares. Só depois de entrar com a licença, o arquiteto de plantão revela seu critério.

Ou seja, tudo é o oposto do estado democrático de direito, que exige segurança jurídica e que os cidadãos conheçam de antemão as regras e seus critérios de aplicação. Não basta a autoridade ser competente. É preciso mais. É preciso previsibilidade. Sem previsibilidade vive-se no caos do subjetivismo da autoridade de plantão.

É viver da ameaça potencial de quem detém a forca da competência legal efêmera.

O Supremo tem ocasião agora de evitar essa insegurança. No julgamento sobre descriminalização de uso de drogas para consumo próprio, que o Ministro Lewandowski em boa hora colocou na pauta de julgamento da sessão extraordinária desta quinta-feira.

De pouco ajudará se o Supremo não estabelecer de alto e bom som, quais os limites que o policial tem de respeitar. Sobretudo porque, neste caso, por uma questão cultural mais do que pessoal, alerta o professor Michael Mohallem, a tendência é achar que o jovem, negro, favelado, pobre, mal vestido é provavelmente muito mais traficante do que usuário.

A lei é omissa. Ou seja, concedeu espaço para que o Judiciário legitimamente estabelecesse critérios. Pelo menos enquanto o Congresso não o fizer.

A discricionariedade de quem detém o poder, isto é, a possibilidade de decidir da forma A, ou da forma B, ou da forma C, seja em relação à maconha, seja em relação aos tributos, seja em relação às licenças para construir, e por aí vamos, é com certeza, a meu ver, um problema da democracia tão grave quanto o da improbidade administrativa. A voz e vez agora é do Supremo.