Artigo publicado no Jornal O Globo, em 04.08.2015

Diante da prisão, qual o destino da liberdade de José Dirceu? Depende. Há múltiplas possibilidades. Pode-se reverter a pena de prisão domiciliar que cumpre pela condenação do mensalão em prisão fechada. Como agravar futura pena de prisão se condenado na Lava-Jato.

O ponto crucial é a data do recebimento de propinas em contratos de prestação de serviço ligados à Petrobras. Se isso ocorreu antes da condenação pelo mensalão, ou depois. Os efeitos diferem.

Se foi antes, é juridicamente chamado de maus antecedentes. Se depois, é reincidência: o réu voltou a praticar crimes mesmo depois de condenado.

Em ambos os casos o ministro Barroso terá que decidir se, com a nova prisão, Dirceu estaria em situação incompatível com o regime aberto conquistado no mensalão, por seu bom comportamento.

Se houve reincidência, e se for condenado pela Lava-Jato, não será mais réu primário. Terá sua pena aumentada, demorará mais para progredir de regime, e os prazos de prescrição serão maiores.

O problema é que não existe um só fato passível de ser considerado crime. Não se sabe ainda quais os fatos que Sérgio Moro considerará no final.

Em tese, fatos diferentes, em épocas diferentes, podem ser maus antecedentes e reincidência. Mas tudo são possibilidades.

Esta prisão extrapola Dirceu. A Lava-Jato extrapola a Petrobras. Apontam para mudanças na aplicação da justiça penal no Brasil.

Está em jogo como o país se posiciona diante do hábito de ex-autoridades de fazerem tráfico de influência com base nos contatos, prestígio e informações que detêm pelo cargo público que ocuparam. Lucrar privadamente com seu passado público é hábito que não constrói a democracia. Abala.

Proust dizia que o hábito é a segunda natureza do homem. Nada mais difícil para uma pessoa ou para um país do que mudar de hábito.

Está em jogo também uma provável mudança do Supremo, que até junho de 2013 nunca condenara em definitivo um político. Numa palestra sobre a Lei de Improbidade, em 2012, o invisível Teori Zavascki disse que a dificuldade de punir políticos era um “mito”. Punições já estavam ocorrendo. O mito está sendo desfeito?