Artigo publicado no jornal Correio Braziliense, em 04.10.2017

Um dos argumentos dos que são contra as candidaturas avulsas, isto é, sem necessidade de serem apresentadas por partidos, baseia-se em números e critérios da própria Câmara dos Deputados.

Estes dados mostram que o atual sistema de monopólio dos partidos permite uma ampla renovação a cada eleição dos deputados. O que oxigena o sistema político e a democracia. Está errado. Não permite, não.

Os dados do Congresso em Números, novo projeto da FGV Direito Rio, que segue a mesma linha do projeto Supremo em Números, analisa dados disponíveis para melhor entender nossas instituições. Com uma vantagem. Os dados do Congresso são mais acessíveis do que os do Supremo. Neste ponto, o Supremo deveria seguir o Congresso.

O objetivo destes dados é permitir análise e debates quantitativos. O objetivo é estimular interpretações e inovações. Convocar a todos para melhor compreendê-los.

Os dados da Câmara, levantados por Fabio Vasconcellos, sugerem que a média histórica de renovação dos deputados é bastante alta. Algo em torno de 40 a 50%. Como dados brutos é isto mesmo. Em 2010, a renovação foi de 46,4%. E em 2014 foi de 43,7%.

Mas quando perguntamos que renovação é esta, isto é, qual a qualidade dos novos deputados, muda-se de figura. A renovação não é expressiva. Vejamos.

Se retirarmos do grupo de novos deputados eleitos em 2014, aqueles que já ocuparam cargos políticos, como vereador, prefeito, ou que foram deputados em duas eleições atrás, a taxa de renovação cai para 38,6%. A renovação da Câmara não implica em renovação dos cidadãos na política.

Segundo, se retirarmos do grupo de deputados com primeiro mandato aqueles que são parentes de políticos, que somam 99, a taxa de renovação da Câmara cai da faixa de 40 ou 50 % para apenas 19%.

Parece claro. Se contarmos os políticos já políticos de outras esferas e os parentes, a renovação é muito pequena. Ou seja, os partidos atuam como filtros, inclusive de nepotismo, em favor de candidaturas de que vêm já com o selo marcado.

A livre competição não se dá, portanto, no momento eleitoral. Ocorre antes, na escolha das candidaturas. Aí é difícil dizer que existe livre competição.

Quanto à discussão jurídica, a Procuradora Geral da República, com o acordo de Raquel Dodge, traz um argumento novo ao debate. Os congressistas não teriam incluído na cláusula pétrea do artigo 60, §4º, onde se lê voto direto, secreto, universal e periódico, os partidos políticos.

Portanto, existiria espaço para uma interpretação nova do Supremo que substituísse a interpretação que reforça o monopólio dos partidos.

De resto, desnecessário dizer, como lembra o parecer de Eduardo Muylaert para o Institutos dos Advogados de São Paulo (IASP), que apenas 9% dos países negam candidatura avulsas. Estamos na contramão. Estamos longe da tendência de democratizar a democracia. É preciso abrir espaço para novas gerações, novas ideias. Estamos em sentido contrário.