Artigo publicado no Jornal O Globo, em 11.10.2016 (Acesse aqui)

Quais meios de comunicação mais influenciaram os eleitores na definição de seus votos? Algumas pesquisas indicam, em primeiro lugar, conversas com amigos. Em seguida, propaganda eleitoral em rádio e televisão, e, em terceiro, mídias sociais.

Rádio, TV e mídias sociais são meios tecnológicos que convergem e se misturam. Difícil separá-los. Indicam também as pesquisas que WhatsApp, SMS, Facebook e Twitter teriam sido decisivos no dia da eleição. Até mesmo na fila de votação.

Conversa com amigos e vizinhos é tradicionalmente fator determinante para o voto. A novidade é que a conversa agora é tecnológica, via WhatsApp ou Facebook. A tecnologia é a nova conversa eleitoral. Mais ainda, é a nova boca de urna.

A legislação eleitoral proíbe boca de urna. Mas a conversa tecnológica é difícil de controlar. Abra seu celular na hora de votar e se abra às influências.

Proibir, limitar ou controlar meios tecnológicos de comunicação é proibir a conversa. E o Brasil está precisando muito conversar entre si.

Digo até que o Brasil precisa hoje mais de conversa do que de propostas e transparência. Receio que quase ninguém aguenta tanta transparência. Um escândalo, uma corrupção por dia. Ou por hora. Não temos mais tempo de nos indignar. Todo candidato tem proposta para quase tudo. Estamos inundados de propostas. Mas transparência e propostas sozinhas não fazem democracia.

Falta conversa. A palavra conversa vem do latim e significa “voltar-se para o outro”, “virar-se para”. Indispensável para viver em conjunto: con-viver.

Uma vez perguntaram ao famoso cientista chileno Humberto Maturana o que ele entendia por democracia. Respondeu: é reconhecer o outro como interlocutor que respeito. Reconhecer sua legitimidade para conversar comigo, acrescentaria.

A falta de conversa ocorre em muitos países. Obama se queixa de que a crise da democracia americana, e temos visto, é o fato de os americanos terem substituído o respeito pelo ódio.

O lamentável debate sobre o ódio anteontem, entre Hillary Clinton e Donald Trump, teve, no entanto, um momento positivo. Um eleitor perguntou: “Hillary, o que você pode dizer de positivo sobre Trump? Trump, o que você pode dizer de positivo sobre Hillary?”.

Freixo, o que Crivella tem de positivo? Crivella, o que Freixo tem de positivo?

Há um claro equívoco na apropriação da democracia apenas por competição, debate, críticas. E nossas conquistas comuns? Nosso patrimônio a preservar? Política não é somente divergência. É convergência. Conversa também.

Como valorizar o igual? O que temos de comum acima de tanta desesperança? Se não perguntarmos, a democracia se transforma na desesperança com a própria esperança.