Artigo publicado no Jornal O Globo, 04.10.2016 (Acesse aqui)

O Judiciário absolveu o candidato Pedro Paulo, mas o eleitor não. Algumas vezes, o Supremo, o Ministério Público e a Polícia Federal vão para um lado. E a opinião pública, no caso, o eleitor, para outro. Caminham em sentidos opostos.

Pedro Paulo teve o apoio de Eduardo Paes, que fez excelente governo. Foi administrador eficiente. Mas, em 2016, o eleitor, informado de todo o processo policial, judicial e comunicativo, fixou-se na convicção de que não pode haver violência de homem contra mulher.

As eleições representam momento crucial de transparência pública. Debate com amplo contraditório. Momento decisivo da democracia. O julgamento eleitoral foi fruto deste processo. O Judiciário tem a palavra final nos autos. Nas eleições, essa palavra cabe à opinião pública.

Os processualismos judiciais, a autoridade dos julgadores, não apagaram a convicção que se formou neste livre debate. Nas mídias sociais, na livre imprensa, nas imagens dos envolvidos. Imagens convencem mais do que palavras.

O fato em si — as lesões — existiu. Divergem as interpretações feitas. A interpretação judicial optou pela autodefesa. A interpretação eleitoral, pela agressão. Esta ganhou daquela.

Essa mesma disputa de interpretações, às vezes, ocorre na Lava-Jato.

Os fatos são evidentes. A existência de contas no exterior, as doações ilegais, os imóveis usados de terceiros. As interpretações é que diferem.

A doação é caixa dois, e caixa dois não é crime. Embora tenha a ministra Cármen Lúcia, em alto e bom som, dito o contrário no mensalão: “caixa dois é crime sim”. O imóvel é usado como se fosse propriedade, mas não está no nome do ex-presidente. A conta no exterior existe, contudo, não é conta, é trust.

Nem sempre as interpretações judiciais e políticas que tentam dar forma e significado aos fatos são capazes de convencer. Às vezes, os fatos não cabem dentro delas.

Eleição é também julgamento. Quando os julgamentos se chocam, a soberania do povo parece não levar em conta a “verdade judicializada”. Pois, o eleitor é o constituinte. O juiz é o constituído.

O que foi feito não pode ser desfeito, diria, em Shakespeare, Lady Macbeth. Mesmo pelos autos.